domingo, 31 de janeiro de 2016

Presídio de Tártarus

Daekor, o Continente do Espírito, é conhecido pela dualidade que compõe seus locais, culturas e pessoas. Desde a queda do véu espiritual, o continente foi dividido em duas espécies de mundos completamente opostos. Aqueles que estão do lado da Luz vivem ao norte, tendo como capital, Nevaj, com suas catedrais brilhantes e monastérios santos de disciplina e harmonia, enquanto aqueles que estão do lado das Trevas, vivendo ao sul, sob a capital de Gigoku, vivem em desespero, em um reino comandado por demônios em terras sombrias e misteriosas.  
Daekor é um continente branco ou preto.
Ao extremo sul do continente do espírito, no lado das Trevas, de frente ao Mar Negro, se encontra o famoso Presídio de Tártarus.
O local é temido por todos os vilões e amaldiçoado pelos paladinos e homens santos, onde ninguém de bem jamais teria coragem de pisar.
            Dizem que o presídio foi construído muito antes da queda do véu, que era uma simples prisão onde pequenos ladrões e assassinos eram presos para pagar suas dividas com a sociedade, algo rústico e construído por camponeses. Não importa o que era antes, pois o local se modificou com a mudança do continente à caída do véu. Hoje o prédio é um imenso presídio de segurança máxima, pois não conta apenas com segurança física, mas também, arcana e profana.
            Ninguém nunca saiu ou entrou sem permissão no Presídio de Tártarus. Não há relatos do que acontece em seu interior, mas mesmo a quilômetros podem-se ouvir gritos de tortura e desespero vindos do local.

            Uma magia faz seus corredores infinitos, podendo conter todas as criaturas malignas de Gensõ – E dizem, até de outras realidades – presos para todo o sempre em suas inúmeras celas.
O local é temido pela maldição que há no prédio. Ninguém morre, seja por velhice ou por assassinato. Suicídio é impossível, aqueles que estão presos no local apenas sentem dores, mas nunca realmente morrem, e mesmo as dores, dizem, são sentidas 100 vezes mais do que do lado de fora. Conta-se que ninguém come no presídio, que seus detentos são deixados ao léu para sentirem as dores da fome e da sede sem nunca realmente morrerem.
            Embora seja um local de justiça, o Presídio de Tartarus não se encontra no lado da Luz do continente. O presídio está sobre supervisão de Gustavus XXI, o ArquiNecromante e regente da parte sombria de Daekor. Por estar desse lado é que o presídio assusta tanto os vilões que ainda não foram chamados no local, pois quando um vilão é muito cruel, muito difícil de se pegar, ele simplesmente é sugado para o presídio quando chega seu momento. Muitas das vezes, esse momento é quando o vilão morre nas mãos de aventureiros bondosos, por isso, muitos acreditam que o presídio, na verdade é uma extensão de algum inferno, construído apenas para castigar os vilões. 
                 Os guardas do prédio são demônios e fantasmas que não entendem o significado de dor e foram feitos para sentirem prazer com o sofrimento dos vivos. O presídio na verdade é um brinquedo para esses seres pervertidos alimentarem seus desejos por sangue e violência, usando a pária da sociedade, pessoas que nem os mais santos dos homens pensariam em dar uma segunda chance pelo nível de seus pecados, sendo deixados no local para sofrerem toda eternidade nas mãos das criaturas malignas que nunca deixarão seus detentos terem paz para todo sempre.


quarta-feira, 13 de janeiro de 2016

Cachoeiras de Marfim


Gensõ não é apenas um mundo de terror e monstros. Há também muita beleza em suas terras. Dentre as ilhas maiores e menores, Lafaza é abençoada com inúmeros cenários de belezas únicas e exóticas. Dizem às lendas que o continente das Águas é abençoado diretamente pelo próprio Clawyn, deus do amor e da música por conta de sua aparência bela. Grandes romances que se tornaram lendas mais tarde nasceram na ilha ao som do mar que o rodeia e o divide.
Dentre esses cenários únicos, na ilha do centro, mais especificamente em Lisne, a capital, encontra-se as Cachoeiras de Marfim.
Um local de difícil entrada e com a saída mais difícil ainda por usa beleza. As cachoeiras são compostas por três imensas grades de rochas que despejam suas águas em um grande rio rodeado por plantas diferentes. As águas que descem das cachoeiras triplas são na verdade marfim líquido, que visto ao longe parecem pérolas liquidas, sendo derramadas delicadamente, vindas das rochas da esquerda e da direita e juntando-se à cachoeira do meio. O cheiro do local inteiro é doce e sedutor, tendo uma beleza imaculada e pura.
Um grande número de ninfas vive na floresta ao redor das cachoeiras, parte para apreciarem sua beleza – já que essas fadas morrem se não estiverem próximas às grandes belezas –, parte para proteger o local. As ninfas do local, que foram batizadas como Ninfas de Marfim, por conta da cachoeira, têm grandes poderes de adivinhação e controle mental. Dizem que quando um casal visita suas proximidades, uma Ninfa de Marfim sempre aparece para dizer tudo sobre o relacionamento, desde sua duração e principalmente se o amor é real.
Apenas casais com intenções puras aproximam-se das Cachoeiras de Marfim, aqueles com intenções ruins enfrentam as Ninfas que utilizam seus poderes de controle mental para afastar invasores.
Ao redor das cachoeiras há uma densa floresta, suas arvores normalmente lembram as cerejeiras darcaelianas, sempre derrubando suas pétalas rosadas, mas com uma observação mais próxima, nota-se que as árvores têm, em lugar de folhas, pétalas de rosas cor-de-rosa. As pétalas tornam-se pequenas borboletas sempre que saem de seus galhos, enchendo o local de vida.
Há um grande numero de animais na floresta, como pássaros, lobos, esquilos, coelhos e até mesmo ursos de grandes portes. Todos são altamente amistosos, nunca atacando nenhum visitante, pois acreditam no julgamento das Ninfas de Marfim de que todos que se encontram ali, mesmo que tenham pecado em vida, tenham índoles ruins, naquele momento não pretendem causar nenhum mal. 
Aqueles que tocaram as águas sentiram seu aspecto delicado e quase grosso, como leite. Seu próprio gosto, aqueles que experimentaram dizem, ser muito parecido com o gosto de leite com mel, mas menos enjoativo e um pouco mais viciante. Tomar as águas da cachoeira é um ato quase ofensivo para as Ninfas de Marfim, sendo aceito apenas pelas tropas de unicórnios que aparecem continuamente próximos às cachoeiras. Nem os outros animais podem fazer isso, tomando água das constantes chuvas que caem em Lafaza.
Banhar é visto como algo bom e até incentivado pelas ninfas, já que suas águas são curativas e purificadoras – um banho é a hora perfeita para experimentar o gosto das águas –. Um dia inteiro de banho na mesma pode até mesmo retirar uma maldição maior, ou mudar a tendência de um vilão, fato pelo qual o local continua imaculado sem a presença de qualquer pessoa ruim que não quer se tornar um pacifista. Por alguma razão as águas da cachoeira só continuam purificadoras e curadoras fora da região, se dadas por alguma Ninfa de Marfim, pois quando pega escondida, com a intenção de levar, é considerado um ato de egoísmo, transformando-se imediatamente em uma água doce normal.

quarta-feira, 18 de novembro de 2015

Hokori e Liaavel - Guerra selvagem



          

            O mundo era verde, marrom e amarelado.
            E cinza nos céus.
            O local cheirava à natureza, com seus odores de flores nascendo, fezes de animais e frutos podres morrendo. Tudo ali seguia as leis selvagens.
            Um tigre corria por um extenso tapete de grama, sentindo as flores dente-de-leão despedaçarem-se quando suas patas rasgavam a terra. O vento alisava os pelos do animal, eram pelos prateados, não um tigre branco, mas prata, com faixas negras. Pelos que brilhavam mesmo num dia sem sol forte, pois uma chuva vinha para o local. Seus olhos eram vermelhos, quase fogo, sempre fitando a frente, para o objetivo de sua corrida.
            Um trovão.
            O tigre prateado começara a correr ainda mais rápido, numa velocidade impressionante, como se seu tempo fosse curto. Talvez fosse.
            O animal era majestoso, assim como cada movimento natural seu. Modos calculados, delicados, porém mortais, enquanto corria em direção a um grande castelo feito de gavinhas e madeira, retorcendo-se para criar um grande espetáculo que era aquela imensa “construção” que cortava os céus que escureciam cada vez mais.
            Não apenas uma chuva, mas uma grande tempestade aproximava-se.
            Assim que o animal chegara à frente do castelo, deparou-se com uma senhora de idade, debulhando-se em lágrimas, jogada no chão, olhando para baixo e passando os dedos, enrugados e frágeis na terra. Como uma mendiga, trajava apenas um manto feito de pele de animais, o mesmo, rasgado e sujo.
            A senhora virou-se para o animal e mostrou sua face cansada, suja, velha...
            Vencida.
            Não era uma humana, era elfa, uma raça orgulhosa daquele mundo, podia-se notar pelas orelhas pontudas. Naquele momento, caídas. Mas seus olhos eram belamente amendoados e escuros, mostravam uma pequena fagulha de sobrevivência, mesmo que quase apagada.
            -- O que faz em minha Mente? – A senhora miou, numa voz fraca e quase invisível voltando seus olhos novamente a terra.
            Outro trovão.
            O tigre sentou-se em sua frente e logo fora consumido por chamas que saíram do nada, cobrindo seu corpo. Quando as mesmas desapareceram não havia mais o animal na sua frente.


            Agora era uma linda mulher.
            Seus longos cabelos negros e lisos dançavam junto ao vento tempestuoso do local. A mulher, alta e esquia, carregava nas costas duas katanas que se cruzavam afiadas como um belo ornamento. Na cintura duas wakizaki descansavam protegidas por uma faixa preta que segurava o belo kimono vermelho. O tecido do qual era feito aquela roupa tradicional parecia feita de próprio fogo e seus sapatos, de madeira eram equilibrados a mais de 40 cm do chão por um salto bem no centro que lhe dava a impressão de estar eternamente sobre uma perna-de-pau, sempre em equilibro, sempre se testando.
            A bela mulher caminhou em direção a outra e tudo naquele lugar parecia mudar. Animais começaram a se atacar usando garras, presas e todas suas formas de ataque, as plantas criavam espinhos e/ou engalfinhavam-se umas as outras numa batalha lenta e mortal. Os insetos usavam suas proteções contra os de mesma espécie.
            Batalha, sangue e acima de tudo honra e justiça. Aquela que caminhava lentamente, no meio daquele campo de batalha natural e selvagem era Liaavel, deusa da Guerra.
            -- Saia daqui... – Sussurrou a velha elfa. Suas lagrimas regavam os galhos que constituíam o castelo gigante atrás de si. Podia-se notar vida naquele lugar, pois as plantas continuavam sempre a crescer, mesmo que lentamente, mas rápido o suficiente para se notar o movimento saindo da terra. – Por favor... Saia daqui... – Repetiu.
            Mais um trovão.
            A outra, majestosa, bela, invencível e inabalável, observou a outra por um momento em silêncio, em seu rosto pálido de gueixa, uma expressão mesclada de carinho, pena e nojo. Abaixou-se fitando olhos nos olhos com a senhora. Liaavel trazia um par rasgados, como típicos de sua nação, Solasel.
            -- Você é uma deusa, Hokori... – Ela falou, sua voz era doce, feminina e calma, porem era superior e soava com firmeza como de um general em batalha.
Sempre em guerra.
            -- Você vai matar meus animais... Vai me matar ainda mais assim...
            A deusa Solaseliana colocou, delicadamente, com seus dedos compridos e finos, com unhas grandes e vermelhas, os cabelos da outra para trás das grandes orelhas.
            -- Batalhar não é o mesmo de morrer, minha querida. Os animais lutam, sobrevivem... Você é a deusa da natureza, Hokori, esqueceu-se dos próprios dogmas?
            A elfa anciã olhou para a outra. Viu olhos gentis e calmos, mas vermelhos, como chamas consumidoras. A anciã começou a chorar ainda mais, abraçou a guerreira e chorou, tendo convulsões e gritando descontroladamente.
            Naquele mundo o frenesi de batalha continuava, animais corriam pelas gramas verdes enterrando garras afiadas em couro duro, bicos em meio a escamas, cascos contra cascos.


            A deusa de olhos puxados esperou a outra se acalmar, enquanto ouvia seu choro e os sons dos animais batalhando.
            -- Vê Hokori? – Liaavel disse quando a outra se acalmou um pouco mais. Apontou para toda a extensão onde a grama e árvores, todas frutíferas, se levantavam, orgulhosos servindo de cenário para toda selvageria que ocorria no momento. – Os animais lutam... Vencem e perdem, morrem e vivem, mas lutam... Você é natureza, minha querida, deve fazer o mesmo.
            -- Não tenho mais razões para lutar...
            Hokori começou a falar, quando uma mão fina bateu-lhe no rosto, deixando uma marca que poderia dizer-se que fora feita por ferro quente, embora ela mesma saiba, foi feita com amor.
            -- Nunca mais ouse dizer isso... – A voz de Liaavel era ira e os maiores animais entraram em estado de fúria em suas batalhas. Os menores fugiram de medo, escondendo-se em suas tocas. -- Sempre há razão para lutar... Isso que você está passando agora é uma guerra. Batalhas não são apenas encontros físicos, mas ir contra qualquer dificuldade. Desistir é morrer, isso sim é morrer! Suicídio, a morte de si mesmo, por desistência, é inadmissível aos olhos de um guerreiro.
            -- Minha filha irá morrer...
            -- Mas não morreu, ainda há modos de salvá-la, Hokori. A própria Chihyõ, sua amada filha, a Oráculo da terra, está lutando para sobreviver e você, como deusa, pensa em desistir? Que vergonha...
            -- Lutando para sobreviver, Liaavel? Ela desistiu, começou a plantar uma substituta, pois sabe que acabou... Ela era parte de mim e agora sabe que ela irá morrer, e se ela está morrendo, porque nós, deuses, não podemos morrer também?
            -- Ela está salvando toda a natureza com a substituição e você é a natureza! Isso é sobreviver... Ela está abrindo mão de si mesma para deixar um todo existente, é a sua própria lei natural. Nascer, crescer, se multiplicar... E morrer!
            A solaseliana levantou a outra pelos ombros com um movimento rápido, autoritário, impossível de se negar. Eram opostas naquele momento. Uma senhora frágil e fraca, tremendo sobre as próprias pernas e uma jovem em seu auge da vida, de ombros e corpo eretos. Olhou mais uma vez dentro de seus olhos, ainda mais penetrante, quase fazendo a outra virar o rosto.
            -- Você vai lutar, vai seguir as suas próprias leis e derrotar tudo e qualquer problema que tentar te derrubar... – Liaavel disse como as ordens de um general decidindo as estratégias de uma guerra. -- Você vai ser uma guerreira, como você realmente é... Ou eu mesma te matarei, Hokori, e acabarei com essa desonra de uma vez por todas.
            E a deusa da guerra desapareceu em meio às chamas que a trouxeram, empurrando a outra no chão. Na sua frente, jogados na terra, apenas os ossos de um tigre, totalmente carbonizados.
            Os animais acalmaram-se sem a presença da honrada deusa, mas agora mesmo os mais fortes, as mais poderosas criações da natureza corriam de medo para se esconder, pois outro trovão soou nos céus, mais forte, mais preciso e a tempestade que outrora se formava, começara a cair.
            Com uma violência guerreira.


O Deus Astro



         
   Em Gensõ não existem tantos deuses menores. Os poucos são conceitos tão importantes que tomaram formas, vida e poder, talvez por suas importâncias ou pela quantidade de adoração recebida que acabou por modificar o Espelho da Realidade, a forma astral que toda existência se compõe.
            Um dos deuses menores mais poderosos e conhecidos é o deus duplo Solarium e Luna.
Enquanto defendem que há dois deuses, pela diferença de conceitos aos quais ambos representam, acreditando serem amantes, rivais ou até mesmo irmãos, tal qual Maagany e Barakon, líderes do panteão maior.
A verdade é que são ambas as faces de um mesmo deus.
Na astronomia de Gensõ, não há um sol e uma lua, mas um mesmo e único astro que se transforma de doze em doze horas em duas formas diferentes para cumprir seu papel. Em todos os locais, quando há noite, em outros também haverá, com exceção de locais modificados por poder mágico, como Daekor, onde parte é sempre dia e outra parte é sempre noite. O mesmo astro desce como sol e sobe como lua todos os dias de doze em doze horas, sendo uma transformação maravilhosa e nunca vista por ninguém. Apenas em raríssimos casos, conhecidos como Eclipse, o astro se torna dois, onde dizem estudiosos, é a libertação das duas personalidades tão conflitantes dentro de um mesmo corpo celeste. Ninguém nunca descobriu o motivo desse acontecimento, mas o Eclipse é sempre prelúdio de algo grande em Gensõ, como batalhas que mudam a história ou mesmo profecias sendo cumpridas.
Pois a lua e o sol são o mesmo, porém opostos.
O Deus Astro, como também é conhecido quando referido em ambas as faces ao mesmo tempo, tem duas formas diferentes.
Quando visto pelas primeiras doze horas da manhã é Solarium. Um deus viril e poderoso, de modos rudes e brutos, agressivo e orgulhoso. Aparece em Gensõ como um elfo de fogo. Sua pele é parda e seus cabelos são chamas vermelhas como o próprio sol como uma fogueira, sempre apontando para cima, seus olhos estão sempre em chamas ardentes, sendo impossível olhá-los diretamente por muito tempo. Normalmente sem roupa, ou com bem pouca, mostra com orgulho todo seu corpo de músculos perfeitos e sempre suados, assim como o grande sexo, sendo símbolo da masculinidade, assim como é protetor dos guerreiros. Sempre carrega uma lança de madeira um pouco queimada, tendo o Fogo e a Terra, elementos masculinos da criação, como seus símbolos alquímicos.
Nas ultimas doze horas do dia é Luna. A deusa é bela e delicada, serena e tranqüila, totalmente oposto de sua contraparte. Aparece na forma de uma belíssima fada-sereia de pele pálida, sentada em uma meia lua flutuante. Com uma longa cauda azul e dois pares de asas de borboletas semitransparentes também numa tonalidade azulada, a deusa está sempre rodeada de pequenas fadas e peixes que nadam no ar. Seus cabelos, longos e lisos parecem sempre úmidos e estão sempre balançando delicadamente ao vento, mesmo quando não há, tendo uma coloração negra como a noite, assim como seus pares de olhos profundos. Mostrando seus pares de belíssimos seios de auréolas rosadas, a deusa simboliza o feminino, assim como a Água e o Ar, elementos femininos da criação. Carrega sempre um pequeno orbe que flutua em suas mãos, rodeado por um brilho azulado, sendo a mesma, protetora dos magos.  

Devotos
Seus clérigos existem em três formas.

Os Filhos do Sol, uma seita que aceita apenas guerreiros do sexo masculino, onde o objetivo é mostrar o máximo de sua virilidade ao mundo. São protetores das batalhas físicas e brutalidades masculinas, proibidos de usar magia, pois acreditam que os homens devem deixar seus instintos masculinos prevalecerem e terem orgulho de todas as extensões de serem homens, desde seus modos até seus corpos. Sua maioria, mais fanática, passa as vidas sem ter contato com mulheres, em igrejas apenas formadas por homens, ou criam laços de companheirismo e até mesmo românticos e sexuais apenas com outros homens, ignorando qualquer mulher, considerando-as muito fracas. Alguns saem pelo mundo, caçando mulheres guerreiras, pois acreditam que a profissão é masculina demais para ser “sujada por toques femininos”. Os Filhos do Sol só atacam seriamente guerreiros do sexo masculino quando estes são clérigos ou devotos de Liaavel, pois de acordo com os mesmos é uma vergonha dizer que a deusa da guerra seja uma mulher, fora isso respeitam todo e qualquer homem que saiba batalhar. A seita tem como símbolo uma serpente em chamas.

                             

             As Filhas da Lua são o oposto, uma ordem feminina que aceita apenas usuárias de magia, como magas e clérigas. Suas devotas são delicadas e estudiosas, sempre tentando resolver os problemas diplomaticamente antes de partirem para a magia, mas nunca usando armas de batalha, suas armas favoritas são o orbe e o grimório, que consideram elegantes, raras utilizam varinhas e/ou cetros por acharem sujas suas formas 'fálicas'. São mulheres dominadoras, sempre batendo de frente com a sociedade machista que tenta oprimi-las. Muitas não mantêm contato com homens, tendo apenas outras mulheres como irmãs, amigas e amantes. Aquelas que se tornam aventureiras são conhecidas por serem caçadoras de magos, pois acreditam que a magia é um dom feminino e quando usada por homens está maculando a deusa. Os clérigos de Therwin são seus alvos favoritos por não aceitarem um deus da magia na forma de um homem. O símbolo da seita é uma aranha de gelo.


Ambos, Filhos do Sol e Filhas da Lua ignoram a contraparte oposta do Deus Astro. Muitos dos seus, são os fieis que acreditam serem na verdade dois deuses diferentes, aqueles que aceitam que é o mesmo deus, defendem que há uma batalha infinita interna onde o masculino e o feminino tentam provar quem é mais forte e por isso tomam esse papel de batalha sexista.

E há ainda uma terceira seita de adoração, um grupo pequeno e raro que adora o deus como um todo, em suas duas formas. Os Filhos do Astro são um grupo misterioso e diversificado que adora a diferença e a dualidade como símbolo principal. Os seus clérigos podem ser o que quiser, embora sempre levem um traço de ambas as faces do deus. Guerreiros mágicos, Magas de combate, Magos especializados em água e ar, guerreiras com espadas de fogo! Todos são muito diferentes, mas levam sempre a dualidade do deus Astro como marca principal, acreditam e defendem que somos todos ambos os deuses, luz e trevas, fogo e água, guerra e magia, dentro de nós mesmos. Seu símbolo é um Yin-Yang, imagem muito difundida em Solasel, onde se acredita ter nascido a seita. 


quinta-feira, 26 de fevereiro de 2015

Aliança Pirata

                    



              O mar ao leste do continente de Lafaza estava agitado como o coração dos tripulantes de ambas as embarcações que se encontravam lado a lado no meio daquela imensidão azul. As ondas pareciam brigar entre si, como se o vento as empurrassem em direções contrárias, quase criando pequenos redemoinhos. De um lado o belo navio de madeira marrom clara, com linhas pintadas em detalhes rosados, num tom simples e feminino. Em sua proa, feita também de madeira, uma sereia apontava para frente, sempre ditando a ordem de avanço. Seus cabelos, mesmo de madeira, eram pintados num forte tom de vermelho, a marca registrada daquele navio que se chamava Ruiva.
            Do outro lado, um navio de madeira escura, quase preta. Podia-se notar que era mal cuidado, diferente do primeiro. Não tinha luxo nem mesmo detalhes que fizesse jus a sua superioridade. Mas no topo do mastro principal, a bandeira que criava desespero nos corações de homens em toda Lafaza, tremulava fortemente com o vento. Uma bandeira de fundo negro, com o desenho de uma caveira. Aquele era o Morte Certa.

            Ruiva tinha em torno de 24 metros de largura, um navio pequeno quando comparado com os 35 metros do navio negro ao seu lado, que embora rude era ainda mais assustador do que o primeiro com seus grande canhões enferrujados apontando para leste e oeste, parecendo sempre prontos para cuspir bolas de ferro de suas bocas arredondadas. A artilharia do Ruiva era menor, mas não menos perigosa. Seus canhões brancos pareciam feitos de porcelana se olhados de longe, embora com as saídas menores que os do Morte Certa eram em maior número, cobrindo não apenas os lados do navio, mas também sua frente e trás.
            Nenhum canhão estava atacando naquele momento, e embora o som do mar e do vento naquela área fossem quase ensurdecedores, os tripulantes de ambos os navios estavam em silencio total.
            Uma prancha de madeira fora posta de um navio para o outro enquanto no Morte Certa seu capitão estava sentado numa espécie de trono de madeira, bem em frente à uma porta que levava a cabine do capitão.
            O homem sentado no trono não era ninguém menos que Barba Negra, o temido. Um homem vivido e experiente nos mares de Gensõ. Assassino, ladrão, estuprador e acima de tudo... Pirata. Seu nome, tirado de um livro antigo, era cantado não só em Lafaza, o continente que tinha piratas como um medo costumeiro. O homem, dizem algumas canções, já havia atacado outros continente e até mesmo outros mundos. Era um homem muito cruel. Quase não tinha cabelo em sua cabeça, mas o que faltava no topo era o que sobrava no queixo. Sua barba era espessa e negra, com algumas tranças e até poucos enfeites que demonstravam um sutil toque de vaidade. Em sua cintura um sabre bonito e bem cuidado e em sua mão, um cachimbo cuspia fumaça enquanto o homem olhava, com apenas seu único olho vermelho que não estava escondido atrás do tapa-olho àquele que se aproximava do outro navio.


            Aquele não... Aquela...
            Vinda do Ruiva, vinha sua capitã, uma mulher que em pouco tempo fizera uma lista de terror se não grande como o de Barba Negra, talvez próxima. Era uma mulher cruel, embora seu rosto quase angelical negasse isso até a morte. Usava roupas apertadas e sensuais, que ao contrario de Barba Negra com ruas roupas rasgadas e sujas, demonstrava uma vaidade sem conta. Nos lábios da mulher um lindo sorriso vermelho enquanto o som de seu salto era ouvido bater na madeira do convés do Morte Certa.
Ploc, ploc, ploc, ploc!

            Ela parou na frente do capitão e o vento fez seus cabelos dançarem. Cada fio era belo, cada tonalidade parecia um arco-íris de uma só cor, que se movia com graciosidade e selvageria, como uma cascata de fogo. Uma cor que dera um nome para a mesma.
            -- Bárbara Ruiva... – Barba Negra falara com sua voz que lembrava os trovões de um dia de tempestade em alto mar, apoiando os cotovelos em suas pernas dobradas. – É mesmo muita audácia escolher um nome tão parecido do meu, cometer atos tão parecidos com os meus e ainda aparecer em meu navio. – Ele puxou o cachimbo com os lábios escuros, secos e quebrados e arrancou uma linha de fumaça do mesmo, que foi levada com o vento selvagem do local, dançando no ar como uma fita cinza. – Está tentando se tornar abertamente minha inimiga jurada?
            Bárbara pôs a mão na cintura e jogando os cabelos para trás sorriu maliciosamente. – Inimiga jurada? Barba Negra... Você não entendeu, não é mesmo? – Sua voz parecia ser própria de uma sereia.  – Quero me unir a você...
            Alguns marinheiros pareceram se afastar de ambos enquanto Barba Negra fitava com apenas seu único olho vermelho o cachimbo de madeira lisa, como se fosse à primeira vez que olhava aquele objeto.
            -- Unir-se a mim? – Sua cabeça levantou, fitando a outra diretamente nos olhos.
            Bárbara não fraquejava, embora os tripulantes ao redor pensassem que a mulher fosse fugir nas primeiras palavras do capitão. – Quem você pensa que é para unir-se a mim? É apenas uma mulher...
            -- Apenas uma mulher? – Ela perguntou num tom firme, aproximando-se ainda mais dele. Assim que chegara a cinco passos do capitão o som de espadas sendo desembainhadas fora ouvido. Logo todos os piratas ao redor dos dois estavam com espadas de aço em mãos, brilhando com a luz do sol. Do outro lado, no Ruiva os poucos tripulantes que acompanharam sua capitã faziam o mesmo, embora em um número dez vezes menor do que no navio de Barba Negra, era uma forma de demonstrar que estavam ali para conversas e negociações, não para brigas.
            Bárbara parou assim que viu que todos se armaram, mas inclinou-se um pouco pra frente e olhou bem para o capitão enfrentando-o descaradamente.
            -- Você deve passar tempo demais em seu navio, Barba, ou então não tem ouvido muito bem o que os bardos em todas tavernas em Lafaza estão contando, creio que até os ventos de Drimlaê já devem sussurrar sobre mim...
            -- Sou um homem que prefere um chão que se movimenta sobre a água do que algo fixo, não saio muito do Morte Certa. – Ele voltou a olhar para o cachimbo, rodando-o em suas mãos. – Mas sim, tenho ouvido falar bastante em seu nome nos últimos tempos, Ruiva... Ouvindo coisas que se forem verdade, eu realmente estou admirado...
            Um murmúrio baixo podia ser ouvido entre o vento. Os piratas de Barba Negra estavam comentando que o capitão nunca se admirava com nada.
            -- Tem um modo de vida bem parecido com o meu, mulher... – Barba Negra continuou. – Mesmas táticas de batalha, mesmas idéias de pilhagem... Alguns dizem que até mesmo os locais que guardamos nosso ouro são próximos... – Ele sorriu com a ideia, seus lábios secos e cobertos de pelos mostraram dentes podres e marrons, mas nesse meio dois dentes de ouro, um inferior e outro superior, brilharam quando o sorriso se fez. – Me pergunto onde aprendeu isso...
            -- Observação e estudo... O que eu tenho de aparência, eu tenho de inteligência. Desde pequena decidi ser pirata, talvez eu um dia lhe conte o motivo dessa escolha. Acontece que para mim, você é quase um herói... – Ela sorriu para ele, um sorriso que desarmaria qualquer homem que tivesse coração. O que não era o caso de Barba Negra.
            -- Você tem crescido rapidamente no ramo, aprendido com “observação e estudo” nos últimos anos aquilo que aprendi em décadas com experiência. É realmente admirável, mas isso são palavras, são historias... E ainda não entendi seu objetivo aqui hoje. Gostaria que fosse clara e rápida, tenho coisas a fazer e não muito tempo a perder...
            -- Eu juntei um grande numero de piratas nesse meio tempo, Barba, tenho uma frota que é quase do tamanho da sua, eu sou a segunda maior pirata de Gensõ... – Ela jogou o cabelo para trás, que balançou novamente com o vento, tirando-o do rosto. – Eu proponho uma aliança! Juntar meus navios e os seus e invadir Lafaza! Tomar as três Grandes Ilhas da Água e sermos os novos Líderes dessa porcaria de local. Primeiro o continente... Depois, quem sabe o mundo... Quem nos impediria? Sua experiência, seu poder, junto à minha inteligência e minha beleza... Seriamos invencíveis.
            Barba Negra puxou novamente a fumaça do cachimbo e sentou-se mais confortavelmente no trono de madeira.

            -- Você é apenas uma mulher que deu sorte... – Ele falou de olhos fechados e sorriso nos lábios enquanto parecia sentir-se bem com o cheiro da fumaça do cachimbo. – Não tem a habilidade necessária de um pirata...
            -- O que? – Barbara gritou. Aquilo não pareceu ofender o capitão, muito pelo ao contrario, ele parecia estar se divertindo com a situação.
            Barbara sacou sua espada. O aço brilhou em sua lamina larga e meio inclinada para cima, como uma cimitarra. Inúmeros homens de Barba Negra já estavam com espadas em mãos, prontos para atacar a mulher. No meio do convéns, girando lentamente num ângulo de 360° e com a espada erguida a mulher gritava:
            -- Se é assim Barba Negra, deixe-me demonstrar minha habilidade de luta... Vejo que apenas quando houver sangue derramado em seu navio você acreditará em minhas palavras! Escolha qualquer um de seus homens e eu o enfrentarei! Verá que não sou apenas “uma mulher que deu sorte”!
            Os homens gritavam, oferecendo-se para lutar contra ela.
            -- Deixa eu ir Barba Negra, vou calar a boca dessa vadia com minha espada!
            -- Não, eu sou melhor espadachim que qualquer um!
            -- Irei cortá-la da cabeça aos pés!
            Mas o capitão apenas levantou dois dedos em silencio. O suficiente para silenciar cada homem ao seu redor.
            Barbara continuava a girar lentamente, apontando para os homens com a espada, encarando cada face rude e feia ao seu redor.
            -- Tenho uma ideia melhor... – Barba Negra se ajeitou mais uma vez no local onde se sentava, como se estivesse incomodado com a falta de conforto. – Lhe darei cinco minutos, não quero mortes em meu navio hoje, o mar não parecer estar com sede de sangue. Nesses cinco minutos, meus homens tentarão impedir você, aquele que lhe machucar será morto por mim mesmo... – Ele levantou um sorriso zombeteiro para a mulher. – Seu objetivo? Encostar essa espada em mim... Qualquer forma, um corte, um furo, tente arrancar uma mão minha, mulher, ouvir dizer que um gancho no lugar dá um ar de elegância a um pirata.
            O rosto de Barbara não mostrava nenhuma expressão de felicidade, na verdade, continuava de forma ameaçada, o que divertia os piratas de Barba Negra.
            -- Combinado... – Antes mesmo de falar, a mulher já corria para o pirata com espada em mãos, seus saltos gritavam sobre a madeira do chão do convés.
            Barbara Ruiva chegou perto do capitão do Morte Certa, até que um grande pirata, que mais parecia um barril a empurrou com um braço peludo e musculoso. A mulher fora empurrada alguns metros a distancia.
            Outros dos homens vieram para cima dela com adagas em mãos, com ataques rápidos e precisos, mas que Barbara defendeu todos usando sua espada. A velocidade da pirata era impressionante. Barba Negra apenas assistia tudo em silencio enquanto ouvia o som do aço chocando-se com as pequenas adagas e observava o movimento da mulher.
            Ruiva não era forte como metade dos homens de Barba, na verdade, perdia feio em força física, sempre que chegava perto do capitão um braço ou um peitoral musculoso a empurrava para trás. A mulher ouvia risadas e zombarias por todo navio. Ela parou, olhou ao redor e pensou por um instante o que poderia fazer.
            Sua mente trabalhou rápido, avistou cordas soltas que pendiam do mastro principal. Uma corda comprida que tremulava com o vento.


            Barbara correu para o mastro principal, afastando-se de Barba Negra. Os piratas começaram a gritar piadas, dizendo que a mulher estava fugindo de medo e que havia desisto, alguns gritavam que Barba Negra havia finalmente assustado-a com o olhar. Mesmo correndo em direção contraria alguns homens continuavam impedindo-a de se locomover, um dos piratas passou-lhe uma rasteira, derrubando-a no chão. A mulher levantou-se numa velocidade impressionante, como se nem ao menos tivesse caído. O que na mesma faltava em força ela tinha em velocidade. Seu cabelo fazia um espetáculo à parte, seu corpo feminino e ágil movia-se com elegância e delicadeza, como uma bailarina entre aqueles homens grandes e rudes.
            Quando chegou perto do mastro principal a mulher pulou alto e agarrou-se em uma das cordas que vira, a mais comprida. Uma adaga quase cortara uma mecha de seu belo cabelo. Com um empurrão da perna direita no mastro, Barbara impulsionou-se para jogar seu corpo em direção à Barba Negra. Alguns homens jogavam adagas em direção ao meio da corta, com a intenção de cortá-la. Muitas adagas foram jogadas, até que uma acertou em cheio a corda que estava esticada como um pêndulo indo em direção ao trono de madeira do capitão. A corda arrebentou e Barbara fora lançada com força em direção ao trono, a mulher parecia voar, mas sua trajetória não estava certa, não chegaria tão perto do trono como havia planeja, na verdade cairia em cima de um grande pirata careca que segurava uma adaga que parecia muito afiada.
            Barbara impulsionou-se no ar em direção ao pirata, moveu-se com graciosidade como se estivesse voando, virou de ponta cabeça e assim que se aproximou do pirata, com sua espada, bloqueou a adaga do outro e com a outra mão criou um impulso maior na careca do homem, empurrando-se agora para perto do trono.
            Tudo aconteceu muito rápido. Os homens corriam em torno do trono, em direção à pirata, a espada de Barbara correu no ar em direção ao peitoral de Barba Negra.
            Um corte.
            Sangue no chão.


            Todos pararam ao mesmo tempo, como se houvessem congelado. A imagem era assustadora, a ponta da espada da mulher encostada levemente na camisa de Barba Negra em direção a seu coração e um sabre atravessado pela costela de Ruiva, de um lado para o outro. Barba havia atacado a mulher com seu sabre em uma velocidade ainda mais impressionante do que qualquer um se atrevia realizar naquele navio. Barbara Ruiva olhou no olho vermelho do capitão e soltou uma golfada de sangue pela boca.
            -- Impressionante... – O capitão sussurrou enquanto puxava com força o sabre de dentro das costelas da mulher. Seu sangue caia no chão de um pequeno furo que o sabre realizou, era tão vermelho quanto seu cabelo.
            Os piratas gritaram bravatas para o Ruiva, enquanto os piratas de Barbara movimentam-se rapidamente no navio.
            Barba Negra levantou-se e olhou para Barbara que ainda respirava, embora com cuidado e devagar enquanto também o encarava e segurando o buraco que sangrava em suas costelas. A mulher ainda tinha um ar ameaçador mesmo nessas condições.
            Os piratas gritavam.
            -- Vamos raspar o cabelo dela e pendurar em nossa bandeira!
            -- Vamos estuprá-la enquanto ainda vive, fazer seus últimos suspiros serem os piores!
          -- Não! – Barba Negra olhou para a mulher e depois para os piratas. – Chamem um clérigo ou um médico, o que quer que tenha poder de cura nesse maldito navio! Curem-na, não a deixem morrer! Ela terá sua desejada aliança!
            Os piratas estavam incrédulos com aquelas palavras.
Um canhão do Ruiva atirou em Morte Certa e um buraco fez-se no convés do navio. Havia poucos piratas do outro lado, mas mesmo esses poucos correram pela prancha que sua capitã havia atravessado com espadas em mãos. Poucas flechas ainda voaram de um navio para o outro.
-- Não matem! – Gritou Barba Negra. – Capturem-nos e os amarrem em meu navio ainda com vida, usarei todos eles... – Ele olhou para Barbara que respirava profundamente com as pernas fraquejando. Um senhor mais velho do que a maioria dos piratas que estava já em batalha com os outros se aproximou da mulher. Era um clérigo de manto azul marinho. – Usarei todos eles... Todos... Você tem sua aliança, faça um bom uso dela! – Barba Negra então entrou para a cabine do capitão.

***
            A batalha ocorria no convés do Morte Certa, ouvia-se tiros, gritos e espadas, mas não havia nenhuma morte naquele dia, o mar não estava com sede de sangue. Dentro da cabine do capitão, Barba Negra, o homem mais temido nos mares de Gensõ, aproximou-se de um espelho que o refletia da cabeça aos pés. A luz do sol entrava por uma pequena janela, iluminando o homem quando o mesmo tirou sua camisa. Seu corpo, forte e peludo, típico de homens do mar era o mesmo, mas no peito esquerdo, perto do coração, uma gota rubra saia de um pequeno buraco, o capitão passou levemente um dedo e fitou aquela única gota de sangue. Embora levemente, a espada de Barbara Ruiva havia realmente atingido-o.
            -- Impressionante! – Ele disse com um sorriso nos lábios secos.


  

domingo, 15 de junho de 2014

Início de uma guerra - História de Darcael.

Há muitos e muitos anos atrás, Liaavel e Therwin travaram sua primeira batalha...
A honrada Deusa da Guerra nunca gostou do "espertalhão" Deus da Magia, e vice-versa, mas ambos se suportavam pelo bem de um panteão no mínimo tranquilo, porém sua primeira batalha estourou por um desejo em igual.
Ambos os deuses desejavam o grande continente de Darcael.

Os humanos, filhos de Tyali, já haviam tomado o local, assim como fizeram com toda Gensõ, mas o Deus da Ironia não necessariamente exige adoração à seus filhos, e por isso muitos corações no continente da terra estavam vazios e a espera de um deus que os tomassem para si.
Rezam as lendas que o próprio Therwin veio em forma de avatar (contam que na forma de um sábio mago) e começou, em Darcael, semear o ódio para com os guerreiros entre os humanos.
Falava que os guerreiros eram abrutalhados e tolos, que a deusa da guerra defendia uma causa de bárbaros.
Justiça havia de ser feita, por isso Liaavel também veio como sua avatar, na forma de uma bela humana. Dizem, aqueles que viram, que a mulher caminhava pelas estradas de terra de Darcael, arrastando duas espadas finas e longas, criando no chão marcas com símbolos estranhos e desconhecidos, alguns estudos descobriram ser letras de canções de guerra, na língua que mais tarde seria a darcaeliana.

Liaavel não falara mal dos místicos, não usaria a mesma artimanha baixa e desonrada que Therwin faria, mas a mulher caminhou e conheceu pessoas. Pregou o nome da batalha justa e honrada por toda aquela terra protegida por grandes cadeias de montanhas.
Um dia, encontrou o avatar de Therwin.
O Deus da Magia havia propagado sua crença também, porém, de uma forma suja e egoísta. Haviam agora magos e guerreiros naquele continente, mas apenas um grupo poderia ficar lá.
Liaavel levantou suas katanas e do outro lado Therwin, seu grimório.
Houve batalha naquele dia. Houve mortes, sangue e destruição.
O avatar de Liaavel havia se apaixonado por um guerreiro, não a paixão mortal como conhecemos, mas um paixão divina. A Deusa da Guerra o havia feito general de seus exércitos e prometido que se aquela guerra fosse vencida, ele seria seu novo Paladino.

Therwin percebera a admiração do homem e notara que havia outros sentimentos em seu coração.
O Deus do Conhecimento, não pensava em matar o avatar de Liaavel, pois assim, não seria de todo vitorioso, já que avatares são apenas representações, com um terço do poder do deus. Matando o avatar de Liaavel, não causaria dano nenhum na deusa, mas fazendo sofrer aqueles a quem ela ama, sim, isso causaria dano na mesma.
Therwin observando a forma com que o general olhava para a deusa em batalha, utilizou uma magia de modificação de carne, e puxou os olhos do homem, tornando-o cego. As magias de Therwin, são muito poderosas e nem mesmo a Deusa da Guerra poderia retirá-las.
Liaavel ficara com ódio, odiara Therwin e o amaldiçoara por ser um deus tão sujo e baixo, por ser, para ela, uma vergonha para o panteão, e então, matara seu avatar.
Havia vitória naquele dia, havia alegria, porém, também havia tristeza...
O general de Liaavel e agora seu Sumo-paladino, nunca mais poderia ver uma batalha, nunca mais poderia apreciar a beleza de uma guerra.
A Deusa odiava Therwin, mas não se deu por vencida, então com seu poder, puxara levemente os olhos de todos aqueles que o seguiam e disse:
"Que esses olhos puxados sejam uma marca que lembre nossa batalha de hoje, que seus filhos e os filhos de seus filhos carreguem no rosto a marca de nossa vitória."

O avatar da Deusa da Guerra construiu então uma nação naquele continente, com suas regras, cultura valores e honra, antes de desaparecer.
O general cego da deusa, se tornou o primeiro Imperador de Darcael, onde comandou, com nobreza e justiça por longos e longos anos.
Os magos então foram caçados no continente, indesejados assim como bestas, pois para os darcaelianos, assim o são.
Há boatos de magos se escondendo no continente, mas quando descobertos não duram muito, sendo levados rapidamente a morte, essa é a regra, essa é a justiça.
Hoje, magos e guerreiros se odeiam, aqueles que andam juntos, aventureiros, são considerados quase uma vergonha para ambos os lados, embora em toda história sempre há seus rebeldes e a guerra entre magos e guerreiros é seguida apenas pelos mais "fanáticos".
Assim nascera os continente de Darcael, e assim se formara a Guerra do Punho Arcano.

quinta-feira, 12 de junho de 2014

Efeitos de Lafaza - Descanso Eterno.

(o som do bardo para acompanhar o texto)

O som do mar e das palmeiras dançava com a melodia extasiante que saía do violão do belo bardo de longos cabelos ondulados e brancos. Seis cordas que balançavam em meio aos rápidos dedos daquele que os tocava e ritmavam divinamente bem aquelas notas, criando a tal melodia.

Havia ao longe duas humanas dançarinas. Suas cinturas ondulavam ao som da sedutora melodia e acompanhavam o ritmo do mar, que lambia a areia da praia lentamente, levando e trazendo pequenas conchas que pareciam brilhar a luz da lua, que cheia tomava grande parte dos escuros céus, como um grande olho assistindo o espetáculo abaixo.

No centro, uma fogueira estalava, dando uma paz e serenidade típica de qualquer praia daquele continente.


-- É sempre assim em Lafaza? – Perguntou a guerreira de olhar terno e armadura rude, um verdadeiro contraste vivo andando pelas areias, e ora sim, ora não, sendo tocada nos pés pelas águas que sempre se encostavam a ela, insistindo de lembrar que estavam lá.
O humano deu uma risada calma e deliciosa. O acompanhante da guerreira usava roupas leves, e embora os ventos frios daquela praia tocassem seu corpo, em várias partes nuas, não pareciam incomodar.
-- Na maioria das vezes... Somos um povo realmente abençoado. – Ele voltou-se para ela, com o sorriso nos lábios, como se fizesse parte de seu rosto, numa máscara sempre alegre e tranquila sem nunca mudarem o ritmo dos passos. – Não gosta dessa tranqüilidade? – Disse colocando as mãos por detrás da cabeça.
-- Existe realmente paz? – Ela falou, ainda sem olhar o humano, apenas fitando os seus próprios pés, que fora da armadura eram molhados pelas salgadas águas do mar.


-- Olhe ao seu redor, tem como dizer que não há paz?
Ela levantou o rosto, viu as dançarinas, o bardo e a fogueira. Sentiu os ventos frios nas partes do rosto que o capacete permitia e ouviu aquela melodia tranquilizante.
-- Não sei... Realmente não sei mesmo... – Ela abaixou o rosto novamente -- Quando se enfrenta monstros como eu enfrentei como o medo, o desespero e o infortúnio. Achamos que realmente o conceito de paz não existe, nunca acabarão as coisas ruins, sempre terá um novo medo ou pesadelo pra enfrentar...
O humano riu novamente, mas sua risada era como de um velho sábio, vendo um erro simples de uma criança, e talvez fosse realmente isso.
-- Por um lado você está certa, sempre haverá novos monstros que tentam nos derrubar – E o vento pareceu soprar mais forte. – Mas o mundo é feito disso... Você luta, cai e levanta, sempre será assim.
-- Então como pode dizer que estamos em paz?
-- Por que paz, minha querida, é o estado de espírito consigo mesmo, estando nesse estado, mesmo no meio do calor de uma sangrenta guerra, haverá paz.
A garota se calou, realmente nunca havia parado para refletir consigo mesma, nunca havia parado. Sua vida era batalha em cima de batalha, nunca dera um tempo para seu próprio prazer. 
Pensou que jogara sua vida fora por conflitos.
Então a guerreira tirou o capacete, deixando o longo cabelo azul e as orelhas pontudas dignas de uma elfa saírem e serem tocados por aquele vento.
-- Minha batalha termina aqui...
Ela sorriu para o céu, e foi como se a lua e as estrelas rissem de volta, com sua bela luminescência prateada.
E o som no violão do bardo continuou dançando entre o vento, comemorando uma nova vida em Lafaza para aquela guerreira.